O Patrimônio da Igreja A Riqueza dos Papas
A igreja de Roma tornou-se extremamente rica e poderosa, com o passar dos séculos, sobrepujando em muito o poder e as riquezas dos reinos e impérios, no período medieval. Esta riqueza e poder, bem como a sua apostasia e completo afastamento das verdades do Evangelho Eterno já estavam anunciados na profecia bíblica com séculos e mesmo milênios de antecedência.
Já nos dias de Constantino, no século IV, o seu patrimônio começou a ser edificado. Entretanto foi na Idade Média que ela atingiu o seu apogeu. A História Universal menciona um golpe de estado ratificado pela Igreja, quando ela recebeu a sua mais expressiva doação e que consolidou o seu patrimônio. Pepino, o Breve (assim chamado por sua pequena estatura), era mordomo do rei franco.
Traindo o seu soberano, usurpou -lhe a sua coroa e foi nisso apoiado pelo papa. Julgamos melhor chamar de rei aquele que detém o poder, do que o que dele foi despojado . Consultado por Pepino, o papa Zacarias referendou com estas palavras a mudança dinástica. Era o beneplácito da Igreja e, com ele, a conseqüente revogação do direito de sangue que legitimava a dinastia merovíngia em nome de um outro: a legitimidade conferida pela sagração. Coroado em 751, Pepino foi ungido primeiramente por São Bonifácio; depois, em 754, pelo sucessor de Zacarias, o papa Estevão II, que estende a bênção a Berta, esposa do soberano, e a seus filhos Carlos e Carlomano, concedendo-lhes o antigo título de patrícios romanos . Com isso proibia aos francos tomarem um rei fora daquela linhagem. Para a Igreja, Pepino era rei por direito divino.
Pepino investe contra os lombardos, resgatando a dívida contraída por ocasião de seu coroamento. O objetivo da campanha é constituir o patrimônio do papa, um Estado à frente do qual estaria o bispo de Roma, que com isso passaria a exercer, ao lado de sua autoridade espiritual sobre os cristãos, também o poder temporal de soberano. Os lances do jogo político são cada vez mais ousados.
É preciso legitimar de alguma forma esse poder temporal do papa, e provar o direito da Igreja sobre as terras italianas. Apareceu então um documento conhecido como Doação de Constantino, segundo o qual o imperador romano teria entregue ao papado o território da Itália. Julgamos oportuno transferir o nosso império (...), pois, no local onde o principado sacerdotal e a capital da religião cristã foram instalados pelo Imperador dos Céus, não é justo que o imperador terrestre exerça o seu poder (...) Concedemos e abandonamos ao papa (...) a cidade de Roma, assim como todas as províncias, localidades e cidades da Itália e das regiões ocidentais, para serem mantidas por ele e por seus sucessores, sob seu poder e tutela (Grandes Personalidades, Carlos Magno , p. 223).
Outro registro histórico demonstra como se iniciou o grande patrimônio material da Igreja de Roma e da riqueza dos papas: Em 754 o papa Estevão II pede o auxílio de Pepino, o Breve, contra o rei Lombardo Astolfo. Em troca, Pepino recebe o título de patrício dos romanos . Após duas campanhas vitoriosas contra os lombardos, o rei dos francos entrega ao papa o Ducado de Roma e o Exarcado de Ravena. Essa doação de Pepino (756) constitui o embrião do Patrimônio de Pedro e do poder temporal dos papas, que irá durar onze séculos. Em 757 e 759, Desidério, marquês de Toscana e sucessor de Astolfo, amplia esse território com outra doação. Mas em 744 Desidério é derrotado pelo filho de Pepino, Carlos Magno, que confirma esta doação e em oito anos adiciona a elas outras três. A aliança se fortalece. Em 1.020, a última doação: de Henrique II, imperador Saxão, ao papa Benedito II (Grandes Personalidades, Gregório VII , p. 252).
A respeito do engano chamado Doação de Constantino , veja-se o que diz outro testemunho histórico: Lorenzo Valla (1.406-1.457) sistematiza a volta à antigüidade greco-romana, instituindo a filosofia latina, a análise textual das doutrinas pagãs, renovando a pesquisa e a crítica históricas, demonstrando a falsidade da doação de Constantino , alicerce abusivo da prepotência política papal (As Grandes Religiões, Catolicismo na Renascença , p. 444).
Carlos Magno, filho de Pepino, confirmou as doações feitas por seu pai ao papado e as ampliou, tomando o Estado pontifício sob sua proteção.
Historicamente Carlos Magno foi um grande personagem, mas que nada tinha de santo. Amava as mulheres em geral, e muitas em particular. Desposou sucessivamente Imiltrude, Ermengarda, Falstrada e Luigarda, e nem por isso deixou de manter incontáveis amantes. Teve pelo menos vinte filhos, entre legítimos e ilegítimos. Extremamente cruel com os adversários, suas campanhas prefiguram as dos futuros cruzados (Grandes Personagens, p. 235).
A respeito das conseqüências políticas e do relacionamento que mantinha com o papado, continua o relato histórico: Mas política envolve concessões recíprocas. A Igreja também soube obter benefícios: estendeu sua influência religiosa por toda a Europa, impôs aos conquistados o Cristianismo, e ao mesmo tempo ampliou suas propriedades territoriais. Recebeu ainda de todos os senhores feudais um décimo de suas produções o dízimo imposto que Carlos magno tornou obrigatório em 779 (Ibidem).
Como prêmio pelos serviços prestados à Igreja e ao papa, foi feito santo por decreto papal, canonizado pela Igreja de Roma.
Divulgou-se rapidamente a idéia da santidade de Carlos Magno: em 1.164, foi canonizado, e ainda que isso não o tornasse santo, como tal passou a ser festejado. As relíquias de seu sepulcro eram veneradas (Grandes Personagens, p. 233, destaque acrescentado).
Depois de Gregório VII, portanto, já com o domínio absoluto sobre todos os povos e nações, a ambição papal não conhecia limites e nem barreiras. Todos os meios eram considerados lícitos desde que trouxessem riqueza e poder para o Vaticano. A religião, nessa época, ocupava lugar de total importância na vida social e política. Cardeais e arcebispos tinham um poder quase absoluto, podendo inclusive imiscuir-se nos assuntos do Estado ( Carlos V , p. 576).
No século XIII o poder papal atingiu o seu clímax. Diz a História: Com Inocêncio III, a Santa Sé atinge o auge do seu poder. Na qualidade de Vigário de Cristo, o papa sente-se no direito de soberania sobre todas as igrejas e todos os reinos. Os legados de Roma espalham-se pela Europa, com o objetivo de fazer respeitar a vontade papal. Os príncipes devem prestar juramento de fidelidade ao pontífice e pagar-lhe um pesado imposto, se não quiserem ser excomungados. Punição terrível, nestes tempos em que os senhores e os reis pretendem governar em nome do Céu. Graças ao poderio financeiro e militar de que dispõe Inocêncio III consegue estender os domínios papais até a Inglaterra. A Sicília, a Espanha e Portugal já eram vassalos da Santa Sé. Por esse tempo, os pecadores nobres ou plebeus, podiam livrar-se das culpas, pagando uma taxa, a porciúncula (pequena porção). Este e todos os demais tipos de impostos levavam considerável fortuna aos cofres da Igreja. Bispos e cardeais viviam em ricos monastérios, como príncipes. Os monges mais pareciam soldados seus, pois durante séculos estiveram armados para defender as terras e riquezas da Igreja (Grandes Personagens da História Universal, São Francisco , p. 311).
Eis outro relato histórico que confirma o poderio alcançado pelo papado, durante o pontificado de Inocêncio III: O apogeu do poder papal na Idade Média foi alcançado com Inocêncio III. Eleito papa em 1.198, buscou até à morte tornar a doutrina da teocracia (governo dos representantes de Deus) uma realidade. São suas as palavras: Roma tem ao mesmo tempo, a chave do Céu e o governo da Terra . Por outro lado foi um feroz combatente das formas de apostolado que não seguiam as orientações de Roma (Grandes Personagens da História Universal, p. 71).
Ainda sobre o despótico pontífice, é interessante consignar outra referência histórica que revela o seu caráter tirânico e dominador: Em 1.198 novo papa é eleito. Inocêncio III, jovem de pouco mais de trinta anos, cheio de idéias na cabeça. Assume com a firme intenção de fazer triunfar a Igreja e o papado , sobrepondo a autoridade pontifícia à imperial. Inocêncio julga que os imperadores usam o poder temporal somente por empréstimo enquanto a Igreja o permitir ( Frederico II , p. 321).
Depois de alguns anos, o papa conseguiu o seu intento de domínio absoluto sobre reis e imperadores, fazendo deles seus súditos.
Eis o que relata a História: Inocêncio III, em Roma, está satisfeito. Para celebrar a vitória do papado e de sua política, reúne um gigantesco concílio mais de 450 prelados, cerca de 1.500 delegados , que aprovará dezenas de proposições, quase todas afirmando as teses de Inocêncio sobre a superioridade do poder espiritual sobre o temporal. As teses, resumidamente, colocam o papa como representante terreno e visível do Deus invisível, dando poderes absolutos para reger a Igreja. Assinalam, ainda, que qualquer desvio da linha ditada pelo pontífice será considerada heresia: um delito contra Deus, e como tal, passível de punição. Quanto à sociedade temporal, ela dependerá das leis determinadas pela espiritual ( Frederico II , p. 325, destaques acrescentados).
Frederico II foi coroado imperador em 1.215, um ano antes da morte de Inocêncio III. Em 1.216 foi coroado novo papa, Honório III e Frederico opôs-se abertamente ao domínio dos papas, em nome do fortalecimento do poder imperial, sendo por isto combatido sem tréguas. Foi excomungado por Gregório IX, que sucedera a Honório, em 1.227. Formam-se alianças contra Frederico. Ele sente que perde terreno, mas ainda obtém algumas vitórias de peso: como o aprisionamento da frota genovesa, onde viajam os prelados que vão a Roma para o concílio de julgamento do imperador ( Frederico II , p. 330).
Todos os extraordinários feitos do grande imperador foram desprezados pela Igreja que procurava ignorá-los, pois tudo que não tinha a direção ou autorização de Roma era ferrenhamente combatido: Por isso a Universidade de Nápoles, por ele fundada, a primeira universidade estatal e exclusivamente leiga, em todo o mundo, foi considerada instrumento do diabo pela Igreja. E o extraordinário triunfo diplomático que devolveu Jerusalém à cristandade foi minimizado pela Santa Sé. Um soberano que delimita com clareza a separação entre o poder temporal e o espiritual; que se coloca acima dos fanatismos religiosos, convivendo com árabes cristãos e judeus, e horror dos horrores pretende sujeitar os bens eclesiásticos ao pagamento de impostos, é um inimigo mortal, a ser combatido com a excomunhão e a intriga ( Frederico II , p. 331).
Nessa época ... os nobres se submetiam ao papa e seguiam para as cruzadas, em busca das terras e riquezas dos povos orientais. Grande parte destas riquezas ia para os cofres da Santa Sé, que rapidamente se tornou a maior potência financeira da Europa. O papa dispunha de enormes extensões de terra, de castelos e até mesmo de sistema bancário organizado. As escolas estavam nas mãos do clero, os tribunais eclesiásticos tinham poder absoluto. A força da Igreja era de tal ordem, que nenhuma decisão importante podia ser tomada sem levá-la em conta ( Filipe, o Belo , p. 367). Outro soberano que também se levantou contra o domínio dos papas foi o rei da França, Filipe IV, chamado o Belo .
Decidido a enfrentar o papa, Filipe reúne pela primeira vez em Paris a Assembléia das Três Ordens, de que participam a burguesia, o clero e a nobreza; pronunciam-se violentos discursos contra o papa. Este reage com a bula Unam Sanctam , reclamando a autoridade da Igreja sobre todos os monarcas ( Filipe, o Belo , p. 368).
A autoridade política e a riqueza material eram os pontos nevrálgicos em que a Roma papal não admitia oposição. A História registra a reação do papa ao tomar conhecimento da ousadia e atrevimento do rei francês, ao ter o desplante de querer cobrar impostos do clero: Grave ameaça pesa sobre a nossa Igreja! exclama o papa Bonifácio VIII um mísero pecador, de nome Filipe, pretende opor seus caprichos à nossa vontade, à vontade de Deus, por nós representada sobre a Terra. Filipe IV, rei da França, que tem o desplante de se chamar Filipe, o Belo, mandou comunicar que, de agora em diante, todos os padres da França deverão pagar um imposto ao Estado (Grandes Personagens, p. 365).
Esta era uma afronta inaceitável e imperdoável, que necessitava de uma enérgica e exemplar resposta papal. A referida bula Unam Sanctam declarava: Os assuntos do espírito são atribuição exclusiva de Sua Santidade, o papa. Sua Santidade delega poderes terrenos aos nobres e soberanos. Tanto uns como outros devem obediência total ao Pontífice . Em outras palavras, o papa se atribuía o direito de controlar as decisões dos reis (Idem, p. 367). Bonifácio VIII proclama o Jubileu de Ouro. Tanto nobres como soberanos devem total obediência ao pontífice (Ibidem).
Contra a prepotência papal manifestam-se também pessoas de destaque, escritores, artistas, pensadores. Dentre estes o escritor e artista Dante Allighieri levantou a sua voz, conforme registra a História: Bonifácio VIII é tenaz defensor da supremacia política do papado. Para ele, a sociedade identifica-se com a Igreja: o papa é o chefe, a ele pertencem as duas espadas o poder temporal e o poder espiritual. Se aos reis é concedido o uso da espada temporal, isso acontece com o consentimento do pontífice. Contra tais princípios rebela-se Dante, que defende a distinção e autonomia entre os dois poderes, cada um em sua própria esfera de competência (Grandes Personagens da História Universal, Dante , p. 356).
No confronto com o papa, o rei francês, em 1.303, organiza o atentado de Anagni , através de Nogaret, seu assessor. O palácio pontifício é invadido e o papa feito prisioneiro. Excomungando o rei, o idoso papa morre dias depois, desgostoso pelas afrontas sofridas, tendo deixado o seu trono puxado pelas barbas.
Então, em 1.305, Filipe consegue eleger papa o arcebispo francês de Bordéus, que assume com o nome de Clemente V. A sede do papado é transferida para a cidade francesa de Avinhão, onde permanecerá por mais de sessenta anos, sob controle do rei da França (Grandes Personagens, p. 86). Daí em diante, o papado, para sustentar o luxo da corte de Avinhão, impõe a toda a Europa pesados impostos, criando as condições de seu futuro desprestígio junto aos fiéis e favorecendo o surgimento de heresias, como as de Wiclif e Huss (Grandes Personagens, p. 88).
Novamente um soberano conseguia, pelo menos temporariamente, predomínio sobre o papado. Aproveitando-se disso o rei determinou que seu avô fosse canonizado, ou feito santo por decreto papal: Em homenagem à figura do avô, Filipe conseguira do papa a maior das honrarias Bonifácio VIII tinha feito dele um Santo, São Luiz (Idem, p. 368).
Tal fato era comum no período medieval. Quase todas as famílias mais importantes, pertencentes à aristocracia dominante, possuíam o seu santo , o que era motivo de grande honraria, conseguida por sua influência política. Uma das inteligências mais respeitadas da época, o pensador holandês Erasmo de Rotterdam, também se manifesta a respeito da situação. Condenou o entusiasmo dos papas pela atividade artística, qualificando-o de desperdício e de amor anticristão ao luxo (Grandes Personagens, p. 466). Num tempo em que os peregrinos retornavam de Roma indignados com o luxo pagão da cidade dos papas, em que as críticas abertas podiam conduzir à fogueira, Erasmo utilizou a loucura para denunciar todos os abusos (Idem, p. 468).
Ele refletia e ponderava: Quantos tesouros materiais os santos padres abandonariam, se o juízo se apoderasse um dia de seu espírito (Ibidem). Erasmo concorda com a crítica à venda de indulgências e com várias convicções de Lutero, contrárias à prática mecânica dos ritos, ao culto fetichista de santos e relíquias, que substituem a religião baseada na piedade... (Idem, p. 470).
A igreja é representada na profecia por uma mulher. Ao contemplar e descrever, com tantos séculos de antecedência a inacreditável riqueza e poder da Igreja de Roma o apóstolo da Revelação escreveu: E a mulher estava vestida de púrpura e de escarlata, e adornada com ouro, e pedras preciosas e pérolas; e tinha na sua mão um cálice cheio das abominações e da imundícia da sua prostituição (Apocalipse 17:4).
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